Da Assembleia Legislativa de Minas Gerais*
O lançamento do Observatório Justiça e Democracia, criado pela Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), foi celebrado nesta quarta-feira (26/6/24) durante audiência pública da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).
O Observatório tem a função de acompanhar o comportamento do Sistema de Justiça e de seus agentes para conscientizar a sociedade sobre a importância dos direitos humanos e do Estado Democrático de Direito e propor alternativas para democratizar o Judiciário, além de denunciar casos de violação de direitos.
Outro objetivo é a construção de um banco de dados qualificado para investigar a médio e longo prazo a Justiça brasileira. “Nosso objetivo é fazer uma luta conjunta, sistêmica, ao lado dos movimentos sociais”, salientou a advogada e integrante da Executiva Nacional da ABJD e articuladora do Observatório Justiça e Democracia, Ecila Meneses.
Qualquer pessoa pode fazer denúncias ao Observatório através de uma plataforma virtual. Um grupo de juristas vai filtrar as informações, organizar os dados e buscar um encaminhamento para cada uma.
Autora do requerimento para a realização da audiência pública, a deputada Beatriz Cerqueira (PT) afirmou que a luta pela democratização do Judiciário é essencial, ainda mais em um período de desafios como o ressurgimento do fascismo. “Talvez nunca tenha sido tão essencial essa luta. Essa é uma audiência pública importantíssima para Minas Gerais. A Comissão de Direitos Humanos é só um instrumento”, declarou a deputada.
A professora, advogada e integrante da coordenação da ABJD, Wânia de Almeida, explicou que a entidade é uma associação civil sem fins lucrativos e suprapartidária, criada em maio de 2018, como desdobramento de uma frente de juristas surgida dois anos antes para denunciar a ilegalidade do impeachment da então presidenta Dilma Rousseff e defender o regime democrático. A organização tem caráter nacional e está em todos os estados brasileiros e no Distrito Federal.
Composta por juristas com atuação em diferentes espaços, desde organismos do Estado até movimentos populares, conta com mais de 2 mil associados e se destaca na defesa da democracia e das garantias jurídicas asseguradas pela Constituição da República de 1988.
Já o coordenador do Núcleo Mineiro da Associação de Juízes pela Democracia, José Eduardo Chaves Júnior, afirmou que a instituição tem a intenção de trabalhar principalmente quatro eixos de democratização do Judiciário. Um deles é aprimorar a representação de gênero e racial. Também reduzir o déficit de formação humanística e de defesa dos direitos humanos dos juízes brasileiros.
Outros dois eixos seriam aumentar a participação da sociedade no judiciário e reduzir o gerencialismo. “A participação da sociedade na Justiça é pífia. O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) é muito institucionalizado”, criticou. O defensor público Gabriel de Carvalho também apontou a necessidade de aperfeiçoamento e de uma maior representatividade da população no CNJ.
Participantes apontam instrumentalização conservadora do Judiciário
Representante do Coletivo Transforma MP, Elaine Nassif afirmou que é preciso combater a estratégia da extrema direita de utilizar ações judiciais como uma arma contra a democracia. Integrante do Núcleo da ABJD no Distrito Federal, Cleide Martins Silva também lembrou o perigo de o Judiciário se deixar usar contra a democracia, por meio de falsas acusações de corrupção.
Joceli Andrioli, membro da Coordenação Nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens, denunciou a estratégia de movimentos conservadores para criminalizar líderes de lutas pelos direitos humanos, também instrumentalizando o Judiciário.
O professor da PUC Minas e advogado da Federação das Comunidades Quilombolas de Minas Gerais - NGolo, Matheus Leite, disse que o Judiciário, o Ministério Público e a Defensoria Pública são cúmplices dos crimes cometidos contra a população mais vulnerável. Ele citou o exemplo das várias decisões do Tribunal de Justiça de Minas Gerais que negaram as consultas prévias às comunidades atingidas por projetos de mineração. Muito aplaudida, a líder do Kilombo Manzo Ngunzo Kaiango, Makota Cássia Kidoialê, reafirmou que a democracia ainda não existe para o povo negro.
Daniela Muradas Antunes, representante da Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas e da Associação Americana de Juristas, solicitou que o Observatório não deixe de avaliar a atuação do Judiciário em relação ao quadro sistêmico de desproteção social dos trabalhadores.
A presidenta da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil em Minas Gerais (OAB-MG), Cristina Fontes, afirmou que a dificuldade de acesso à Justiça pela população mais vulnerável é evidente até nas regras de vestimentas impostas para se permitir a entrada em fóruns.
Raimundo Aragão, do Conselho Federal da OAB, destacou o papel das instituições de defesa dos direitos humanos na educação e conscientização das gerações mais jovens sobre a importância da democracia.
A superintendente de Promoção, Proteção e Participação Social da Subsecretaria de Direitos Humanos, Mariana Bicalho, defendeu a capacitação de servidores e mesmo de juízes, a fim de reduzir a dificuldade de implantação de políticas de proteção aos direitos humanos em municípios do interior.
* Matéria publicada dia 26 de junho, data de lançamento do Observatório Justiça e Democracia em Minas Gerais.