O ano era 2016. Numa tarde do dia 17 de abril, o Brasil parou. E em meio ao início daquele pesadelo de dimensões ainda inimagináveis, um grupo de juristas de todo o Brasil se deu a liberdade de sonhar, de resistir juntos, juntas e juntes e de lutar pelo povo brasileiro e pela democracia. Talvez por teimosia, talvez por profunda consciência de nossa missão histórica e política, ou ainda por uma primorosa sensibilidade estética - sim, pois o país e o mundo por qual lutamos é belo, é bom, é justo e é culturalmente múltiplo - foi que nós nos reunimos, nos organizamos e fundamos uma entidade que hoje, mesmo ainda tão jovem, já deixou a sua honrosa contribuição para a história do Brasil. Em maio de 2018, nascia para uma vida longa de lutas e sonhos a ABJD.
Forjada na tradição de militância da classe trabalhadora, onde a unidade e o fortalecimento das forças populares são norteadores das ações políticas, a ABJD traz uma característica especial que a ajuda a agregar e a dialogar: ser composta por profissionais de todas as áreas do Sistema de Justiça, bem como por acadêmicos (as) e estudantes. Talvez por isso trazemos naturalmente a capacidade de olhar a nossa conjuntura de maneira sistêmica e travamos permanente diálogo universal com todas esferas e instâncias do judiciário. Feito um coração materno, a ABJD proporciona este grande encontro e debates instigantes.
Mesmo com essa formação plural, entendemos ser fundamental a existência e a parceria entre entidades e coletivos que organizam o campo democrático nas áreas específicas do Sistema de Justiça, tais como as representações de juízes, do Ministério Público, da advocacia popular e progressista, da Defensoria Pública, dos (as) policiais, professores e estudantes. Nos associando a outras organizações articulamos muitas de nossas lutas. Compreendemos a necessidade de construirmos sólida unidade de forças políticas que lutam pelos direitos da classe trabalhadora e pelos direitos humanos. A nossa voz deve ser de um coletivo forte, firme e representativo da população historicamente criminalizada pela sociedade, excluída das políticas de Estado e alijada dos espaços de poder e de decisão.
Estamos num período histórico muito grave e complexo. A mais importante pauta da atualidade está em derrotar o fascismo e em defender a democracia. Em todo o mundo vemos a radicalização e a polarização política entre a burguesia - e o seu projeto neoliberal - e a classe trabalhadora - e um modelo de mundo ecologicamente responsável e humanamente digno. Mas a classe dominante alimenta o rompimento do pacto social que construiu minimamente algumas das tradicionais e antigas aspirações civilizatórias e humanitárias da época de uma burguesia revolucionária. E mesmo que com suas modestas e limitadas inserções sociais, este pacto emergiu com a vitória de trabalhadoras e trabalhadores que, em acúmulo de lutas seculares, estabeleceram os marcos da igualdade e da inclusão social, ao elevá-las à condição de norma constitucional e internacional, e ao viabilizá-las como políticas públicas de governo e de Estado.
Ao longo da história dessa nossa jovem entidade tivemos a coragem de lutar pela democracia em várias frentes. Fomos protagonistas em importantes embates da política nacional, tais como a denúncia do golpe de 2016, o desmascaramento da parcialidade do ex-juiz Moro e a farsa da Operação Lava-Jato, a campanha pela liberdade e pela inocência do presidente Lula, o alerta sobre a grave crise ambiental, a luta contra a perda de direitos trabalhistas, a denúncia da responsabilidade do governo federal na gestão criminosa no enfrentamento à COVID-19, a construção do “superpedido de Impeachment”, a articulação da Coalizão em Defesa do Sistema Eleitoral, o apoio e a vigília em prol do bom funcionamento das eleições de 2022, o repúdio às ações golpistas do dia 8 de janeiro de 2023, a disputa pela democratização na composição dos cargos do Sistema de Justiça, para citar algumas de grande relevância.
Uma das ações mais corajosas da ABJD foi a campanha MoroMente. Enquanto a grande mídia festejava a nefasta Operação Lava-Jato, que foi responsável por um desmonte em áreas estratégicas da indústria brasileira, a nossa entidade denunciava a farsa de Moro como um herói justiceiro. A ABJD posicionou-se intransigentemente pelo respeito ao Princípio do Devido Processo Legal, um dos mais importantes princípios constitucionais assegurados na Constituição Federal. O objetivo da campanha centrou-se em explicar à população quais foram os crimes que o então juiz e, posteriormente, ministro da justiça de Bolsonaro, cometeu quando atuou nos processos contra o presidente Lula.
Outra ação que devemos destacar é a investigação sobre o Sistema de Justiça e a formulação de uma proposta democrática para o seu aperfeiçoamento. Combatendo concepção anacrônica das estruturas e dos procedimentos do sistema que nega acesso à Justiça para quem mais precisa e, com isso, sonega e negligência direitos, a ABJD esteve à frente de várias atividades coletivas para debater e construir a proposta: O Sistema de Justiça que Queremos. A nossa entidade rompe com a perspectiva de que o Sistema de Justiça é uma prerrogativa exclusiva ou corporativa daqueles que estão no exercício de seus cargos, e parte do pressuposto de que este sistema diz respeito aos direitos dos brasileiros e brasileiras. A partir desta nova concepção pautamos a nossa militância. Junto com outras entidades irmãs, nós estivemos como uma das organizadoras do Fórum Social Mundial Justiça e Democracia, como realizadora do Seminário Nacional e da reunião sobre “O Sistema de Justiça que Queremos”, e como uma das entidades autoras do documento que consolida a nossa proposta democrática que foi entregue ao ministro Flávio Dino.
Comemoramos o nosso aniversário com a consciência de que somos um somatório de várias histórias de luta e de vida que construíram e que constroem este país. Festejamos a nossa data com renovada esperança de sermos um olhar que se lança para um cenário futuro de outras tantas vidas e histórias a serem construídas numa existência democrática e inclusiva. Na nossa obstinada militância, típica dos utópicos e desvairados, teimamos e desejamos um Brasil grande e um mundo imenso, posto que serão do tamanho de nossos sonhos, infinitos de bondade, de beleza e de justiça.
Parabéns a todas, todos e todes que constroem e que vivem esta combativa e guerreira entidade. Salve a ABJD! Muito sonhos de vida!