Nota | ABJD manifesta preocupação e repudia novo manual do Ministério da Saúde sobre aborto

29/06/2022

Nota | ABJD manifesta preocupação e repudia novo manual do Ministério da Saúde sobre aborto


O abortamento legal, nos casos previstos na legislação, é uma conquista das mulheres brasileiras que buscaram tutelar, mesmo dentro de uma sociedade patriarcal e machista, o direto à interrupção da gravidez de forma protegida e segura nos casos de feto anencéfalo, risco para a gestante e da gravidez resultante de estupro.


O sistema criado para proteger a mulher e seus direitos, que conta com uma rede institucionalizada de unidades hospitalares e clínicas especializadas vinculadas ao Sistema Único de Saúde (SUS), vem sendo constantemente atacado pelo atual governo federal.


Em 2020, o Ministério da Saúde editou a portaria 2.561 determinando a notificação compulsória dos casos de atendimentos de mulheres vítimas de crimes sexuais às autoridades policiais, sob o pretexto de se apurar o crime de estupro, retirando da mulher a decisão de comunicar o crime à polícia.

 
Estatísticas apontam que apenas 3% dos estupros resultam em condenação dos agressores. Além de ser um crime de difícil comprovação, que em muitos casos é praticado sem qualquer tipo de violência aparente e sem vestígios clínicos, como no “estupro conjugal”, onde o crime ocorre dentro da relação estável, dentro do casamento. Os dados demonstram o quão difícil é o caminho da mulher que decide denunciar seu agressor, já que o sistema hoje, que envolve as polícias e a justiça brasileira, permanece culpabilizando as vítimas pelas violências que sofreram, conferindo proteção velada - às vezes escancarada - aos autores de tais delitos.

 
No último dia 28 de junho, o Ministério da Saúde realizou uma audiência Pública para debater a elaboração de um manual intitulado: “Atenção Técnica Para Prevenção, Avaliação e Conduta nos Casos de Abortamento”. O chamamento excluiu entidades e movimentos de mulheres e teve convites restritos, privilegiando autoridades e coletivos contrários ao aborto legal, impedindo direito à fala de não convidadas e restringindo, até mesmo, o acesso da imprensa.


A Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD) manifesta, primeiramente, seu repúdio a um procedimento que não foi verdadeiramente público, nem inclusivo, e ao conteúdo de um documento que, ainda não divulgado, já se antecipa como mudança na nomenclatura do termo “aborto legal” para “aborto com excludente de ilicitude”, fazendo tábula rasa do dispositivo do Código Penal em uma interpretação supérflua e francamente ilegal, com o intuito de perseguir mulheres que recorrerão ao abortamento.


É temerário que um tema de tamanha relevância siga sendo debatido de forma enviesada e contaminada por ideais misóginos e patriarcais.


Sabemos que as mulheres mais vulneráveis ao crivo desta nova empreitada absurda do governo, são negras e pobres, pois já têm dificuldades de acessar o sistema de saúde, policial e de justiça. O medo de serem ainda mais criminalizadas aumentará a subnotificação dos casos de estupro e, consequentemente, menos mulheres buscarão o sistema de saúde para interrupção segura da gestação oriunda de um crime.


Nesse sentido, atentando para o fato de que uma norma interna de um Ministério já nasce ilegal ao alterar uma Lei Federal, a ABJD segue acompanhando e observando os desdobramentos da edição e lançamento do manual anunciado pelo Ministério da Saúde. No mérito, repudia qualquer tipo de retrocesso nas garantias e proteção à mulher no seu direito ao abortamento nos casos específicos previstos em lei, com tratamento humanizado, sem revitimização, sem violação de sua privacidade e da sua dignidade.


Foto- Marcelo Camargo Agencia Brasil

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