Dilma Rousseff (PT) saiu vitoriosa de um processo que moveu contra um homem que tirou uma foto sua durante um voo e acusou a ex-presidenta, em postagem nas redes sociais, de viajar de primeira classe usando dinheiro público. A ação foi proposta no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) por advogados que integram a Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD).
“A decisão é fundamental em um contexto de frequentes ataques à honra e à intimidade de mulheres no Brasil. Não é autorizado a ninguém utilizar imagens não consentidas para fins de escárnio e difamação, mesmo quando a vítima se tratar de figura pública”, explicou a advogada Anna Luiza Santos Marimon, do escritório Direito Social.
A publicação que “atingiu a honra objetiva e subjetiva” da ex-presidenta foi feita por Julio Martini em novembro de 2019 e viralizou: "Olha a companheira Dilma, voando First Class de Dubai pra SP...eu não disse Caracas ou Havana para SP… Dubai para SP...meteu aquele Caviar, umas boas taças de Dom Perignon, e logicamente aquele vinho Francês...uma maravilha...Parabéns para você que também paga por isso!!!", dizia a legenda.
De acordo com a jurista que faz parte da ABJD, desde a entrevista inicial foi questionado se o comportamento do agressor seria o mesmo diante de um presidente. “Seguramente não seria. O agressor é um típico representante da elite brasileira. Embora o público-alvo de seus negócios seja feminino, não foi capaz de demonstrar oposição respeitosa à primeira presidenta do Brasil. Imaginou que sairia impune. Essa vitória consagra a máxima de que o machismo sai caro”, definiu.
Na decisão, a juíza Luciana Torres Schneider determinou que o réu terá que pagar R$ 25 mil por danos morais e classificou o tom usado por Martini como "debochado e grosseiro". A magistrada afirmou que o réu foi imprudente ao dar a entender que a ex-presidenta fez uso de dinheiro público em uma viagem luxuosa. “Ele próprio viu que era uma inverdade, tendo em vista que a viagem da autora para Dubai foi custeada pelos organizadores do evento que ela participou. […] Ressalte-se que, mesmo que a autora estivesse em viagem paga com os recursos por ela obtidos em razão da pensão oriunda da sua condição de ex-Presidenta, ainda assim, é incabível a manifestação do réu, tendo em vista que o ganho mensal obtido pela autora tem amparo em lei, é lícito e também é recebido pelos seus antecessores. De modo que ela pode fazer o que bem quiser com o seu rendimento”, apontou.
A sentença destaca que Martini agiu com escárnio, o que ofendeu, constrangeu, humilhou e menosprezou a autora. “Desbordou dos limites da crítica, da surpresa, da indignação e da livre manifestação do pensamento”.
A magistrada diz que a situação é agravada pelo fato de o autor ilustrar as suas palavras com uma fotografia não autorizada por Dilma e tirada "em um momento de descuidada intimidade", já que ela aparentava estar dormindo.
Segundo a decisão, o direito à livre manifestação do pensamento é uma garantia fundamental, mas não absoluta, que deve ser exercida de forma responsável, já que a inviolabilidade da honra e imagem também é um direito assegurado a todas as pessoas.
"A liberdade de manifestação e crítica aos governantes e políticos em geral não podem e não devem extrapolar esses limites e ser utilizados de forma abusiva, de modo a atingir a honra alheia, a qual está vinculada diretamente à própria dignidade humana", diz a juíza.
Foto: Greg Salibian/Folhapress