ABJD pede que PGR apure quem elaborou e divulgou vídeo homenageando a ditadura militar

02/04/2019

ABJD pede que PGR apure quem elaborou e divulgou vídeo homenageando a ditadura militar


por Cecília Figueiredo

A Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD) protocolou, nesta terça-feira (2), representação na Procuradoria Geral da República pedindo que se apure quem encomendou, quem produziu, quem divulgou e a pedido de quem foi feita a distribuição do vídeo de aproximadamente dois minutos em defesa do golpe militar de 1964, em 31 de março.

Tânia Maria de Oliveira, integrante da coordenação executiva da ABJD, esclarece que o presidente da República Jair Bolsonaro descumpre a Constituição Federal.

“Desde o começo da década de 80, o Brasil inaugurou um regime de transição democrática, consolidada nesta Constituição em que se respeita o direito à memória e à verdade, dos períodos de ditadura vividos no Brasil. Não cabe a um agente público, nesse contexto, ser contrário a esses preceitos constitucionais e divulgar qualquer tipo de material que possa manche essa história”, acrescenta o advogado Gabriel Sampaio, da ABJD.

Na avaliação de Tânia Oliveira há uma pretensão de fazer um revisionismo histórico do que aconteceu no Brasil.





Apologia ao golpe militar

No material enviado pelo Whatsapp oficial do Planalto, no domingo (31) – 55 anos do golpe militar -, um homem reforça a narrativa do presidente Jair Bolsonaro, segundo a qual a ditadura foi necessária para livrar o país do comunismo, regime político nunca instituído no Brasil. A fala é direcionada ao público jovem: “Nosso céu, de repente, não tinha mais estrelas que outros”.

O narrador, um ator profissional segundo revelou o jornal O Globo, finaliza o vídeo de quase dois minutos concluindo que o Exército salvou o Brasil do comunismo. “O Exército nos salvou. O Exército nos salvou”, repete ele. “E tudo isso acontecia num dia comum de hoje [sic], um 31 de março”.

O vídeo não tem nenhuma marca do Governo ou de qualquer instituição oficial. Não foi veiculado em nenhum outro canal governamental, como site ou redes sociais, mas na página do filho do presidente, deputado federal Eduardo Bolsonaro. A Secretaria de Comunicação da Presidência (Secom), porém, confirmou que o canal usado no WhatsApp é um número oficial do Planalto.

“Se o Palácio do Planalto envia um vídeo por um canal de comunicação oficial do Planalto e a Secom assumiu que o Whatsapp pertence a à rede de comunicação do Planalto existe uma responsabilidade, que é uma via de mão dupla. E em havendo responsabilidade de servidores isso é improbidade administrativa. Sendo um ato do presidente da República pode ser crime ”, explica a advogada da ABJD.

O vice-presidente Hamilton Mourão, atual presidente em exercício, também confirmou a um grupo de jornalistas em Brasília que o vídeo “foi divulgado pelo Planalto" e que foi "decisão dele [de Bolsonaro]” a sua veiculação.

Segundo ela, é inadmissível que o governo Federal utilize um canal de comunicação oficial para mandar um conteúdo que já havia motivado reações da sociedade civil, de organismos de Estado, do MPF e defensorias públicas. “É preciso que se esclareça”, enfatiza.

O pedido de instauração de procedimento pela ABJD para apuração é dirigido à procuradora-geral da República, Raquel Dodge.

Para Sampaio não há dúvidas de que todos os agentes públicos envolvidos “com essa tentativa de recontar de forma deturpada a nossa história devem ser responsabilizados”. Ele espera que PGR e MPF exerçam as suas atribuições constitucionais para haver uma responsabilização.

Tânia concorda e aguarda manifestação de Raquel Dodge. “Lamentavelmente ainda não houve uma manifestação da PGR, assinada pela doutora Raquel Dodge, mas houve intensa manifestação do Ministério Público Federal. Várias procuradorias são citadas na peça protocolada. Diversas procuradorias mandaram recomendações para os comandos militares de seus estados para que não houvesse nenhum tipo de festejo. A Procuradoria Federal de Defesa do Consumidor, que integra a estrutura da PGR, emitiu também uma nota logo no primeiro momento”.

Manifestações

Em 25 de março, o porta-voz da Presidência, Otávio Rêgo Barros, informou que o presidente Jair Bolsonaro determinou ao Ministério da Defesa fazer "comemorações devidas" sobre o evento que instalou uma ditadura militar no Brasil.

Houve, em decorrência da notícia, uma série de repercussões. Em ação coordenada, que reuniu procuradorias da República em pelo menos 19 estados e Distrito Federal, o Ministério Público Federal solicitou às unidades militares a adoção de providências, para que não seguissem a  orientação.

O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e o Instituto Vladimir Herzog denunciaram à Organização das Nações Unidas (ONU) a atitude do presidente Bolsonaro, classificada como uma "tentativa de modificar a narrativa sobre o golpe de 1964".

No domingo (31), mais de 50 organizações divulgaram uma nota de repúdio às declarações de Bolsonaro de rememorar o golpe de 1964, assim como a "tentativa de relativização e revisão histórica proposta pelo presidente".

Empresário assume elaboração do vídeo

Pouco depois de juristas da ABJD protocolarem o pedido junto à PGR, um empresário paulista, eleitor declarado do presidente Jair Bolsonaro, assumiu ser o responsável pela gravação do vídeo que exalta o golpe e a ditadura militar divulgado pela Presidência da República no último domingo (31).

Em nota enviada com exclusividade ao Congresso em Foco, Osmar Stabile diz que produziu o vídeo por sua iniciativa e com recursos próprios. O empresário afirma que é um "entusiasta do contragolpe preventivo", pois, segundo ele, é "assim que boa parte que os historiadores sem ideologias preconcebidas enxergam '1964'".

Segundo a reportagem, o advogado de defesa Piraci Oliveira negou o envolvimento de seu cliente com Bolsonaro e de ter enviado a representantes do governo federal.

Clique aqui para acessar a íntegra do documento protocolado.

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